sexta-feira, 30 de abril de 2010

Cantar Alentejano





Chamava-se Catarina

O Alentejo a viu nascer

Serranas viram em vida

Baleizão a viu morrer

Ceifeiras na manhã fria

Flores na campa lhe vão pôr

Ficou vermelha a campina

Do sangue que então brotou

Acalma o furor campina

Que o teu pranto não findou

Quem viu morrer Catarina

Não perdoa a quem a m...atou

Aquela pomba tão branca

Todos a querem p'ra si

Ó Alentejo queimado

Ninguém se lembra de ti

Aquela andorinha negra

Bate as asas p'ra voar

Ó Alentejo esquecido

Inda um dia hás-de cantar.

Zeca Afonso

Onde vai a alentejana
Voando e a cantar
Lá vai de burro a magana
P´ró futuro a recuar

Caminhando gasta as botas
No burrico as ferraduras
Não louva a padres ou curas
Por becos e ruas tortas
Chegará a horas mortas
Cantando nem sei porquê
De boa vida não é
Nem riquezas nem farturas
Diga-me lá é você
Onde vai a alentejana

Os fados que ela entoa
No acento transtagano
Só falam de desengano
Da sua esperança à toa
O burrinho já nem voa
escutando seu fadistar
Pára muito admirado
Preso à beleza da voz
Sua dona muito a sós
Voando e a cantar

Cantando a garotona
Dos males que não merece
Mais feliz do que parece
E dando voltas à mona
Pensa o burrico da dona
No lombo com a alentejana
Cantando o fado cigana
Batendo pé no caminho
Mais lento que vagarinho
Lá vai de burro a magana

Esta coisa de ter mote
Em versos preso no pé
O meu forte é que não é
E eu nem sei o que é meu forte
Falando da alentejana
Cruzando terra maninha
A invenção não é minha
Pondo a cachopa a voar
Sem curso de pilotar
P´ró futuro a recuar


José Brás

quinta-feira, 29 de abril de 2010


nas barragens hás garças
nas praias há as gaivotas
no litoral há o polvo
no interior a bolotas

existe o Alentejo da praia
litoral e povoado
é lindo e também gosto
mas prefiro o outro lado

tem gaivotas a voar
e gente de toda a raça
no litoral a o peixe
no interior há a caça

o nosso Alentejo tem
porco preto de bandeira
dizem aqu...eles que comem
é bom de qualquer maneira

Baco é o Deus do vinho
disso nos orgulhamos
não há no mundo outro igual
como o vinho alentejano

Idalina Silva

No Alentejo


No Alentejo,
nessa planície que parece encostada ao céu,
nesse parado pensar que parece meditar,
nesse branco de cal amado nas árvores soltas,
nessa brisa quente desenhada na aragem,
nesse falar cantado de encantador,
nessa gente junta que junto trabalha,
nesse espaço imenso a perder de vista,
nessa solidão serena dos campos d...e viagem,

O Alentejo
é um ombro branco lindo e nú da paisagem.

José António Peres Sottomayor

A dor da felicidade


Planícies
Do meu encanto
Na distância por estar perto

Montes
Do meu aconchego
Na lonjura por que desperto

Secura
Da minha sede
Na permanência onde acerto

Paisagem
Que me enamora
No resistir em campo aberto

O meu sofrido abraço
Descendo a sul do Tejo

Para ti lindo Alentejo

António MR Martins
2010.04.23

Mandado


Fui fazer um mandado
mas perdi-me no caminho
comprei tudo o que era doce
nada que minha mãe pediu
rodilhas, azevias,
piretes e popias
não comprei nada que fosse
o que minha mãe queria
fui fazer um mandado
mas perdi-me no caminho.

Maria Antonieta Oliveira

O meu Alentejo.



Que lembro de ti, meu Alentejo?
Lembro a vastidão dos campos,
Tons de verde, de amarelo,
E vigiando a planície,
Orgulhosa sentinela,
Lembro a torre do castelo.
Lembro a casa do moleiro,
Agora meio destruída
E as velas do seu moinho
Asas paradas sem vida.
Nada ficou da aldeia,
A água tudo engoliu,
E naquele g...rande vale
Onde antes passava o rio,
Salvou-se o cimo do outeiro
Onde apenas um sobreiro
Ramos virados ao céu
Como que a pedir clemência
Resiste à calma e ao frio.
Lembro aqueles que partiram,
Os que partiram chorando,
Carregados de tantas mágoas
Que as mágoas os estão matando.
Será que os ventos mudaram
E que tudo está mudando?
Será que os teus filhos voltam
E que regressam cantando?
Vento que trazes notícias dos que partiram chorando
Traz novas dos seus regressos,
Diz-me se voltam e quando.

Francisco José Lampreia

Mais um dia em que me sinto perdida de mim perdida no mundo. Será que o mundo me esqueceu?!Ou sou apenas eu que me esqueci. Não creio; também nem quero acreditar quando se nasce o nosso destino está escrito. Temos que aprender a voar, sei que aprendi. Mas sem consentimento caí aos poucos sem ter asas p`ra voar. Quero encontr...ar o meu eu Verdadeiro, já me procurei em cada belo jardim só meus olhos viram as flores do canteiro, também procurei no azul do mar e do céu. Só meus olhos viram tanta beleza sem fim! Estou a ficar cansada de tanto me procurar. Por mais que tente é constante a procura mas em vão. Meus olhos vêem toda a beleza do mundo, só que o meu coração está de mim tão perdido que a vida deixou de fazer sentido, faz-me andar como barco no mar á deriva. Hoje sou mais um pássaro na asa ferido, sem ter eira nem beira nem asas para puder voar. Vou caminhando p´lo mundo, como se fora um vagabundo tentando o meu eu encontrar.

…………….. Leo marques

Retrospecção


O tempo que passou sem horas dadas,
Nas marcas da noção e do sentido…
Um
fardo de mensagens inventadas,
Na alma de um poema repartido…

O
Mundo com o mundo em cada regra,
E a mescla que me diz tudo amiúde…
Um
gesto que me põe na lista-negra...,
Por ser o fazedor de um gesto rude…

Um
rosto paladino ou sorridente,
Nos pontos reunidos e dispersos…
A
ampla concepção da boa gente
Que faz a claridade dos seus versos…

Um
Sítio de afectos, de queixumes,
Na vasta comunhão, - emoldurada…
Um
repto - com querelas e ciúmes -
Provindo de quem nunca me deu nada…

António
Prates

A primeira vez que te disse adeus


Ó olhos azuis
Que já foram meus
Agora
são doutro
Paciência adeus

Da primeira vez
Que te disse adeus
Dá-me cá um beijo
Desses
lábios teus

Desses
lábios teus
Que tem
mais valor
Dá-me cá um beijo
Ó meu lindo amor

Os olhos que olham
Pró chão e pró ar
Esses
é que são
Os que eu hei-de amar

Cancioneiro Popular

Na encosta de uma serra havia um carrascal
Onde
nascia o tojo, a esteva, um matagal.
Um dia entrou com ele a foice
roçadora;
Meteram a charrua e fez-se a lavoura.
Foi revolvida a
terra e feita a sementeira.
Algum tempo depois, já parecia um mar
O
vento sobre o trigo ao longe a ardear!
Foi crescendo, crescendo; a
es...piga bem dourada
Com o calor do Estio em pouco foi ceifada.
E
produziu bom pão o terreno maninho,
Onde apenas vencia a urze e o
rosmaninho!

Agora quando eu olho essa encosta da serra,
Vejo
que é uma lição que nos ensina a terra!


A sociedade é o
monte. A escola é o arado.
Quando abrindo o sulco, olhai vá bem
guiado...
Depois é semear. Será bela a colheita
Se a semente for
boa, e a lama for bem feita.


Também hão de dar pão essas
searas novas
E darão muita luz à humanidade inteira...


Abri
a terra, abri, fazei a sementeira...


Alda Guerreiro Machado

Renovação
n. 7 de 15 de Novembro de 1931.

OS TEUS OLHOS SÃO MAIS VERDES QUANDO CHORAS*


E os meus nem sei da cor que são quando choro.

E choro!... Ver mais
Chorei sem vergonha, ainda agora, diante da gente que se juntava à mesa do almoço, em Moura.

Eu explico melhor.
Colóquio de homenagem à memória de quem saiu de Moura para morrer em África, diziam, que em defesa da pátria.

Durante a minha intervenção, a custo me contive porque as palavras saltavam sem controlo, directamente do coração para o oxigénio da sala cheia.

Ainda assim, a determinada altura, querendo dizer a palavra décadas, perdi-me em deca…deca…deca, olhei em volta a pedir socorro e alguém na mesa disse décadas.

Escapei. O pânico passou e acabei um discurso de 20 minutos que havia pensado para palavras diferentes.

Almoço alentejano, depois, bom vinho, branco com uns enchidos, uns queijinhos e tal. Tinto também com um bom prato de carne, conversa com os vizinhos da mesa.

Um daqueles grupos corais polifónicos, juntou-se, enlearam braço a braço, cantaram e… esbarrondei-me.

Aquela voz vinha da terra e os cantores eram apenas as colunas do sacro sistema sonoro que consagrava o telúrico.

Pensei!
Estes gajos não existem. Quer dizer, a gente que representam, cantando de braço dado, não são eles. Pode até dizer-se que nem existe já tal gente, perdida nos séculos de uma vida dura e firme, de batalhas contra a fome a exploração desumana, de sol-a-sol engravidando a terra do patrão.
Não, porra!
Que sufoco era aquele que me chegava do fundo de mim, me esganava subindo até à boca, aos olhos, à cor e à temperatura da pele da face?

Tentei resistir e não pude.
Tentei esconder e não pude.
Ao meu lado a companheira do Luís estendeu um guardanapo e disse não te contenhas.

Já não escondia. Os outros fingindo que não viam e eu fingindo que não sabia que eles viam.

Parou o cante mas não as lágrimas, teimando no caminho que a força da gravidade lhes impunha.

Largos minutos para que serenasse, num jogo conivente e colectivo de faz de conta que não foi nada.

Recuperado da pancada súbita, não esperei muito. Agarrei minhas coisas e, quase à francesa, levantei o braço direito e disse obrigado até à próxima, pessoal!

José Brás

Sangue e dor


Sangue e dor...

Os campos desta terra trigueira
Emanam uma beleza especial
Terra de soberbas azinheiras
Perdidas nos confins de Portugal

Moças cantam em trova brejeira
Doce cantiga , poema ancestral
Melodia de uma vida inteira
Que cantam em tom soberbo, abismal

Ai minha terra, enorme clamor
Estás cravada na minha mente
Corres-me ...no sangue com tanta dor

Olhos no céu te imploro Senhor
Dá um novo alento a estas gentes
Fá-los sonhar, com um mundo de amor

Antonia ruivo

Moreninha Alentejana


Moreninha alentejana,
quem te fez, morena, assim
Foi o sol da
Primavera
que caía sobre mim

Que caía sobre mim
que andava a ceifar o trigo
Moreninha alentejana
por que não casas comigo

Porque não casa comigo
Porque não casas com ela
Quem te fez morena assim
Foi o sol da Primavera

Cancioneiro popular

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Sementeira


Sementeira

Na encosta de uma serra havia um carrascal
Onde
nascia o tojo, a esteva, um matagal.
Um dia entrou com ele a foice
roçadora;
Meteram a charrua e fez-se a lavoura.
Foi revolvida a
terra e feita a sementeira.
Algum tempo depois, já parecia um mar
O
vento sobre o trigo ao longe a ardear!
Foi crescendo, crescendo; a
es...piga bem dourada
Com o calor do Estio em pouco foi ceifada.
E
produziu bom pão o terreno maninho,
Onde apenas vencia a urze e o
rosmaninho!


Agora quando eu olho essa encosta da serra,
Vejo
que é uma lição que nos ensina a terra!


A sociedade é o
monte. A escola é o arado.
Quando abrindo o sulco, olhai vá bem
guiado...
Depois é semear. Será bela a colheita
Se a semente for
boa, e a lama for bem feita.


Também hão de dar pão essas
searas novas
E darão muita luz à humanidade inteira...


Abri
a terra, abri, fazei a sementeira...


Alda Guerreiro Machado

Renovação
n. 7 de 15 de Novembro de 1931.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Par de botas


A Cuba dei-a um saltinho
e traga um par de botas
mas ande com cuidadinho
não estrague as botas novas

( Soneto ) Alentejano


Deu agora meio-dia; o sol é quente
Beijando a urze triste dos outeiros.
Nas ravinas do monte andam ceifeiros
Na faina, alegres, desde o sol nascente.

Cantam as raparigas, brandamente,
Brilham os olhos negros, feiticeiros;
E há perfis delicados de Trigueiros
Entre as altas espigas de oiro ardente.

A terra prende aos dedos sensuais
A cabeleira dos trigais
Sob a bênção dulcíssima dos Céus.

Há gritos arrastados de cantigas...
E eu sou uma daquelas raparigas...
E tu passas e dizes: Salve-os Deus!

Florbela Espanca

Alentejo

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Indicação do lugar

( Foto de Luís Milhano )


Chegamos a uma página em branco atravessada por
um súbito silêncio uníssono
o rio é uma dobra do olhar onde sempre estivemos em surdina

é o exacto lugar
indiciador dos músculos

quem ousa escancarar as portas à cidade

Autor: Carlos Nogueira fino poeta Alentejano nascido na cidade de Évora

Paisagem alentejana, manhã de nevoeiro.



Fotos do grupo Poemas e poetas Alentejanos mundo fora no facebook

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Saudade ( Cantando o Alentejo )


Saudade ( Cantando o Alentejo )

Ai se eu soubesse cantar
Cantigas de amor e chão
Para assim puder bailar
Segura na tua mão

Cantar eu não sei não
Minha mãe não me ensinou
Para o campo me mandou
Trabalhar colher o pão
Perdida na imensidão
Da planície Alentejana
Passava toda a semana
Trabalhando de sol a sol
Todos entravam no rol
Deste lado do Guadiana

Botei olhos num pastor
Rapaz de bigode farto
Perdida fiquei de quatro
No seu modo trovador
Cantou-me cantigas de amor
Roguei que me ensinasse
A cantar tamanha classe
Mostrou-me a terra lavrada
Anafou-me em ceara dourada
E mandou que me calasse

Minha sina assim traçada
Entre o trigo e o montado
Entre um beijo roubado
Entre o tudo e quase nada
De uma vida mal fadada
Cantei no vento suão
Cantigas em contra mão
Cantei como soube a saudade
Cantei a fraternidade
Na era da revolução


Hoje lembrando o passado
Olhos no céu peço a Deus
Que traga prós braços meus
Um pastor engalanado
Não precisa trazer gado
Contento-me com coisa pouca
Basta que traga voz rouca
Versos bem alto gritar
Que me faça cantar e bailar
A seu lado alegre fado

Antónia Ruivo

domingo, 11 de abril de 2010

Alentejo




Folheia-se o caderno e eis o sul
E o sul é a palavra. E a palavra
Desdobra-se
No espaço com suas letras de
Solstício e de solfejo
Além de ti
Além do Tejo

Verás o rio e talvez o azul
Não o de Mallarmé: soma de branco e de vazio
Mas aquela grande linha onde o abstracto
Começa lentamente a ser o
Sul

Outro é o tempo
Outra a medida

Tão grande a página
Tão curta a escrita

Entre o achigã e a perdiz
Entre chaparro e choupo

Tanto país
E tão pouco

Solidão é companheira
E de senhor são seus modos
Rei do céu de todos
E de chão nenhum

À sombra de uma azinheira
Há sempre sombra para mais um

Na brancura da cal o traço azul
Alentejo é a última utopia

Todas as aves partem para o sul
Todas as aves: como a poesia

Manuel Alegre (Alentejo e ninguém)

sábado, 10 de abril de 2010

Abalei do Alentejo


Abalei do Alentejo "

Num passado perdido
Verão quente alentejano
Débil criancinha
No machibombo foi metida
Sem voto ou vontade
P'ra cidade foi trazida
Para trás ficou
Aquilo que nunca teve
Ar puro, liberdade,
Brincar na natureza,
Ver searas a crescer
Ou pelos montes correr.
No seu coração,
Sempre manteve
A saudade do que não teve.
S...uas raizes alentejanas
Continuaram pelo tempo
Morrerão consigo
Quando levada no vento.

Maria Antonieta Oliveira

sexta-feira, 9 de abril de 2010





Se fores ao Alentejo,

ante a beleza infinita

tranquila, clara, bendita

sem querer vais semear,

do teu olhar comovido

lágrimas no fértil solo

a semente do teu beijo

se fará meigo trigal

e num belo madrigal

o desejo do teu olhar.

se elevará rumo ao sol

quando sonha o rouxinol.



Aires Plácido & Maria Petronilho

10/6/2007